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O reconhecimento e a valorização de um povo na sociedade passam, necessariamente, por sua cultura, tradição e língua. E só é possível acessar essa ancestralidade e preservar usos e costumes antigos a partir do conhecimento que se propaga não só na fala, ou seja, na expressão oral, mas também na cultura escrita. 

Quando uma cultura é de certa maneira forçada a abandonar suas origens, tudo o que se escreveu (literalmente) há centenas de anos, como textos sagrados, poemas, correspondências pessoais, documentos legais, acaba se perdendo. Logo, preservar os alfabetos e tudo o que ele carrega é fundamental.

E é exatamente isso que se propõe o projeto chamado Endangered Alphabets. Trata-se de um Atlas online que mostra sistemas de escrita indígenas e minoritárias que estão lutando para se manterem vivos e não caírem no esquecimento.

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Sem alfabeto, o grande risco de virar lenda

De acordo com informações do Atlas, idealizado pelo estadunidense Tim Brookes, 85% dos sistemas de escrita do mundo estão prestes a desaparecer. Um dado estarrecedor. Isso significa que o alfabeto não possui status oficial e não é lecionado em escolas públicas. Na prática, essas tradições não são naturalmente encorajadas pelos meios oficiais. 

Hoje, o site revela ao todo 97 alfabetos que correm risco real de extinção. Em cada um deles, é possível encontrar um breve perfil desse alfabeto, saber a localização desses sistemas de escrita do ponto de vista geográfico, além de links para se obter informações adicionais, bem como imagens que ilustram o alfabeto em questão.

O trabalho iniciado por Brookes pode ser entendido como uma forma de resistência, uma vez que preservar a escrita mostra-se um enorme desafio nessa época de sociedade conectada. Até porque, em linhas gerais, as telas de smartphones, tablets e notebooks apresentam, a priori, o alfabeto latino, assim como a prevalência da língua inglesa. E nada muito além disso.

A força da resistência diante da dominação

Uma pergunta elementar é: como um alfabeto desaparece? Essa pergunta torna-se ainda mais curiosa quando se nota que muitos dos sistemas de escrita considerados ameaçados hoje em dia já foram essenciais em sua cultura. Porém, acabaram sucumbindo, inclusive em razão de perda espaços territoriais de seus grupos.

Um exemplo presente no próprio site Endangered Alphabets é o mongol. O alfabeto mongol estava ligado a escritos imperiais, afinal, estava vinculado ao maior império terrestre contíguo da história, que se estendia do Pacífico ao Mediterrâneo. No final da Segunda Guerra Mundial, porém, não era mais usado oficialmente nem sequer na Mongólia.

Ainda sobre os motivos pelos quais um alfabeto acaba se perdendo, é importante reconhecer também os processos de dominação. Fato é que uma comunidade acaba perdendo sua língua ou então seu alfabeto quando sofre algum tipo de perseguição de um grupo mais forte e dominante. 

Vale ressaltar também que os governos podem, sim, colaborar para esse processo, principalmente quando estabelecem o ensino de uma língua se sobrepondo a outras línguas mais tradicionais e faladas na região. É por essas e outras que iniciativas como o Endangered Alphabets têm um papel tão importante.