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É praticamente impossível calcular quantas línguas desapareceram na história recente, mas o fato é que esse fenômeno vem ocorrendo. Não por acaso este ano de 2019 foi declarado pela ONU, Organização das Nações Unidas, o “Ano Internacional das Línguas Indígenas”. O objetivo é dar uma atenção especial e preservar a cultura dessas línguas, que são as mais afetadas quando o assunto é extinção. 

A Rússia vem lutando contra essa terrível tendência que assola o mundo. De acordo com Ígor Barínov, chefe da Agência Federal de Assuntos Étnicos do país, existem 40 grupos étnicos minoritários que vivem na Rússia e, das 151 línguas ali faladas, 18 correm o risco de desaparecer, já que não possuem mais de 20 falantes nativos anciãos. 

Nos últimos 150 anos, segundo Ígor Barínov, a Rússia perdeu 14 idiomas, dos quais cinco já no período pós-soviético. Isso ocorreu mesmo depois de ter sido iniciado, ainda na URSS, um programa do governo para proteger as línguas indígenas.

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Migração e urbanização como motivos

Muito se fala sobre os motivos desses acontecimentos. Especialistas apontam que o aumento da migração e a rápida urbanização estão contribuindo para o encolhimento das línguas minoritárias, já que muitos grupos étnicos acabam alterando seus tradicionais modos de vida. 

Assim, muitos povos, a fim de garantir sua participação na comunidade, inclusive do ponto de vista socioeconômico, acabam optando por adotar as línguas dominantes. Em se tratando da Rússia, os povos minoritários acabam por ensinar o russo no lugar de sua própria língua nativa.

Conforme Rasul Mutalov, pesquisador do Instituto de Linguística da Academia Russa de Ciências, o Cáucaso do Norte russo é uma das regiões em que as línguas indígenas estão sumindo. Mutalov afirma que a situação, aparentemente estável, começou a mudar na última década. Isso porque as pessoas que viviam em áreas montanhosas iniciaram um processo de migração para o interior, para cidades e aldeias, e começaram a falar cada vez mais o russo como língua principal na comunicação. 

“As gerações mais jovens agora não falam seus idiomas nativos. Os idiomas estão morrendo bem diante de nossos olhos”, diz o pesquisador.

Outro exemplo que ilustra esse cenário é do povo tchelkan que vive na região de Altai, na Rússia. Esse pequeno grupo étnico de pouco mais de 1 mil pessoas também está deixando de lado sua língua materna. Tradicionalmente, os tchelkan falam sua própria língua há séculos, mas como ela não é escrita e, também, mais limitada sobretudo à comunicação familiar, cada vez mais é trocada pelo russo.

A luta pela resistência. Mas por quê?

Se o movimento linguístico é dinâmico e acaba sendo natural que algumas línguas acabem morrendo, por que não apenas deixá-las seguirem seu próprio fluxo e se extinguirem? Há dois bons motivos para seguir na resistência. 

O primeiro ponto vai na direção cultural. As línguas indígenas são o pilar de sustentação da identidade de grupos étnicos e colaboram na apresentação de uma herança cultural única e modos de pensar tradicionais. Isso significa que quando um grupo étnico perde sua língua, com ela acaba se perdendo grande parte da identidade histórica do grupo.

O segundo ponto aponta para a diversidade. Ou seja, quanto mais línguas existirem no mundo, mais rico se mostra. “Quando uma imagem é colorida, é mais valiosa. Mas quando tudo é mais ou menos o mesmo, monótono, isto empobrece o mundo”, diz Andrêi Kibrik, diretor do Instituto de Linguística da Academia Russa de Ciências.

A Rússia tem promovido eventos para conscientizar o público da importância de se preservar as línguas. Hoje, o intuito é garantir que os povos indígenas considerem sua língua uma vantagem, e não uma desvantagem. 

Nos últimos anos, as autoridades se empenharam para reconhecer e proteger as línguas minoritárias. Um exemplo é criação de um Fundo de Preservação e Pesquisa das Línguas Nativas da Rússia, que trabalha dentro de um novo conceito para a aprendizagem e ensino de línguas minoritárias, algo que o país ainda não possui.

Vale citar também um sistema diferenciado, criado nos anos 1980 na Nova Zelândia, em que os falantes mais velhos da língua participam da educação na primeira infância da criança. A ideia é melhorar a transferência de conhecimento do idioma entre gerações. Desde 2013, esta linha foi implementada em cinco jardins de infância e produziu resultados satisfatórios na comunidade. 

“Acho que nossa geração é responsável por transferir nossos idiomas e conhecimento às próximas. Não devemos apenas ficar de braços cruzados. Devemos lutar”, encerra Rasul Mutalov.

Fonte: Russia Beyond

 

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