Photo by Annie Spratt on Unsplash

Se existe um ponto em comum entre todas as línguas do mundo, sem dúvida nenhuma, é a beleza. Todas as línguas, sem distinção, são belas e têm o seu valor. Conhecer suas origens e seu processo de adaptabilidade ao longo dos anos, já que todo idioma é um ser vivo e, portanto, mutável, também ajuda a enxergar a beleza por detrás das línguas.

Na língua portuguesa, quando consideramos esses dois aspectos principais, chegamos à percepção clara da forte influência africana presente em nosso dia a dia – e que talvez a gente nem se dê conta. Estudos indicam que existem em torno de 3 mil palavras de origem africana presentes no cotidiano de brasileiros, o que, convenhamos, não é pouca coisa. 

A importância dessa influência, aliás, era evidenciada no Museu da Língua Portuguesa, que tinha previsão de ser reaberto neste primeiro semestre de 2020, mas que tende a ser adiado em razão da pandemia de coronavírus.

Leia também:

A expansão do vocabulário a partir da pandemia

O novo jeito de fazer negócios na era digital

África caminha para ter maioria de falantes da língua portuguesa

No setor do famoso museu chamado “Palavras Cruzadas”, por exemplo, era possível encontrar palavras ligadas a certos comportamentos, tais como lengalenga (conversa enganosa), dengo (ser astuto e sedutor), encabular (sentir vergonha ou provocar) e xingar (ofender com palavras).

“Ao expor o acervo de palavras africanas que entraram no vocabulário da língua portuguesa, o Museu da Língua Portuguesa favorecia reconhecer à história a população africana no Brasil como agente da cultura e da língua portuguesa que se desenhava sobre este solo”, aponta Wilmihara dos Santos, cientista social que trabalhou na área educativa do museu por oito anos.

Influência africana começou ainda na escravidão

É fundamental ter consciência de que o continente africano como um todo é um dos grandes responsáveis pela língua portuguesa que temos hoje no Brasil. Essa riqueza, beleza e variedade linguística está diretamente vinculada ao povo africano. 

Para compreender melhor essa influência, é preciso revisitar a história. Durante quatro séculos, precisamente entre o XVI e o XIX, o Brasil recebeu um sem número de navios para mão-de-obra escrava africana. Estima-se que tenham desembarcado no país aproximadamente 5 milhões de pessoas.

E esses homens e mulheres trouxeram junto suas histórias, culturas, religiões, lendas e um grupo enorme de línguas, cerca de 300, faladas em mais de 20 países, entre eles Camarões, Guiné Equatorial, Angola, Namíbia, Congo, Uganda, Zâmbia, Moçambique e África do Sul. Sobre as línguas africanas que foram mais faladas por aqui, vale citar iorubá, quimbundo e quicongo.

Essa influência africana se materializou em vários setores da língua portuguesa, especialmente na oralidade, mais do que na escrita.

Hoje, encontramos palavras de origem africana em meio a divindades (Ogum, Iemanjá), práticas religiosas (Umbanda e Candomblé), comidas (vatapá, acarajé, farofa, quindim, jiló, quiabo), nomes de lugares (Caxambu, Bangu, Muzambinho), instrumentos musicais (macumba, berimbau), animais (Camundongo, marimbondo), entre outros.

Veja uma lista de termos africanos utilizados no Brasil

Angu – massa feita de farinha de milho ou mandioca

Babatar – apalpar, tatear

Banguela – pessoa sem os dentes da frente

Batucar – tocar o batuque

Bengala – bastão pequeno

Bobó – sopa de inhame

Cachaça – aguardente

Cachimbo – tubo para fumo

Caçula – o filho mais novo

Careca – calvo

Empate – igualdade de situação

Miçangas – joias de pouco valor

Moleque – menino, rapazote

Muamba – negócio ilícito, velharia

Mulambo – trapo, roupa esfarrapada

Papagaio – ave trepadora

Quilombola – escravo refugiado em quilombo

Quitute – iguaria de apurado sabor

Tanga – pano que encobre as partes genitais